5ª feira, 16 de março: acordo, como é habitual, com o chamamento do meu filho. são 8h 30m da manhã. sinto umas cólicas intestinais a chatearem-me o baixo ventre. arranjo o diogo, dou-lhe o leite e espero a chegada da minha fada do lar. às 9h vou para a casa de banho mas...nada, claro. tomo banho e verifico que as ditas cólicas intestinais vão e vêm de 5 em 5 minutos...tipo contracções, estão a ver?? ;P resolvo sair e andar um bocado para ver o que acontece. já na rua lembro-me de ir ao centro de saúde - mesmo aqui ao pé - e pedir para ser observada por um médico (não me apetece estar a pôr a família em alvoroço para depois não ser nada). não há médico para me observar mas a enfermeira avisa que num 2º filho a dilatação é muito mais rápida e que com contracções tão seguidas devo ir para o hospital. vou...ao café, 'tá claro! a meio da bica sinto uma tão forte que tenho que parar a meio...ligo ao pai-vagem que se põe a caminho de casa e falo também com a famelga para ter alguém que me fique com o diogo. já em casa arrumo tudo, verifico "bagagem" e quando o pai-vagem chega saímos directinho rumo a lisboa. as contracções aumentam de intensidade e o trânsito também...o marquês de pombal em estado de sitío e os 4 piscas a valerem de nada! quando chegamos ao hospital mais uma cena macaca: o vigilante da entrada não nos quer deixar entrar e, após saber o motivo da urgência, remata com um: "no mínimo devia vir a apitar!"...pessoal a parir na magalhães coutinho: entrar a apitar, ok?? como é óbvio não nos ficamos por aqui e no instante em que o pai-vagem estaciona o carro aparece um polícia a dizer que ali não podemos ficar. o pai-vagem já a perder as estribeiras explica uma vez mais que há ali uma mulher em trabalho de parto. o mais que conseguimos foi fazer-me sair do carro e ir sózinha para as urgências de mãos na barriga.
entro, inscrevo-me e espero. as contracções ainda suportáveis. toque: colo do útero permeável a 2 dedos. ctg com contracções fortes e regulares (ver foto). arfo com dores. pai-vagem entra, diogo fica com a tia céu no carro. decidido que sou internada vou para os procedimentos habituais: depilação deluxe, clister (2?!?!) e roupinha para dentro de um saco do lixo. pedem-me para aguardar no corredor e nessa altura já eu me torço de dores.
subo para o 2º piso, já acompanhada do pai-vagem e à saída do elevador a enfermeira tem que travar a porta porque sinto uma dor tão forte que não consigo sair sem que passe. quarto com ela, ctg, soro, antibiótico. toque: 5 dedos de dilatação (meia-hora após a entrada no hospital). pai-vagem à cabeceira da cama a relembrar a lição de há um ano atrás. dores intensas, respiração controlada, aguardar...
passado um bocado chega a anestesista. toque: 8 dedos de dilatação. é-me dito que falta pouco e que devo decidir se quero ou não a anestesia. lembro o desespero do ano anterior e digo que sim. sucumbo ao medo e não à dor (mais tarde arrependo-me muito). doi-me a levar com aquilo. sinto choques electricos na perna esquerda. deito-me e aguardo o fim das dores que acaba por não chegar. sinto uma diminuição da intensidade das contracções para logo voltarem em força. sinto dores fortes na perna esquerda e queixo-me. as contracções continuam a aumentar de intensidade. peço ao pai-vagem para chamar alguém. é-me explicado que tendo a epidural sido administrada tão tarde, é normal que não tenha o efeito desejado. novo toque: she's coming! o mesmo frenesim do ano anterior: gente a entrar e sair da sala, grávida em posição, sala preparada. muita gente na sala (médica, enfermeiras, estagiárias). pedem-me para fazer força a cada contracção (embora eu não sinta necessidade de a fazer). suo, bufo, expludo em força. sinto-a. sinto-me. a calma e magia da expulsão do diogo dão lugar a um parto real, à força animal da expulsão da minha filha. faço força e volto a fazer. sinto-a sair. primeiro a cabeça. mandam-me parar. sinto-a meio dentro, meio fora de mim. e depois aquele momento supremo em que ela escorrega do meu corpo para o mundo...
chora muito, faz-se anunciar. choro muito, sinto-me completa.
não a vejo. peço ao pai-vagem que me diga como é. depois vem a mim. aos meus braços. e os 9 meses em que a carreguei ficam para trás. todas as angústias, todas as lágrimas, todas as incertezas são lavadas com as palavras que lhe sussuro...
olá filha...